terça-feira, 26 de outubro de 2010

Sobre ovos, bolinhas de papel e o Velho Lobo

Há já algumas décadas o bêbado, comunista, e agora saudoso, Fausto Wolff descrevia o que era ser jornalista então. Eram na maioria sujeitos saídos das periferias, que aprendiam o jornalismo fazendo-o. Ele mesmo, como grandes outros, começou escrevendo as colunas policiais em Porto Alegre, com 14 anos, simplesmente porque tinha algum jeito com as palavras e precisava sustentar a família de sei lá quantos irmãos. Tinham o ponto de vista popular, porque era daí que tinham vindo e, a propósito, onde estavam. Jornalista pegava ônibus, passava a noite em delegacia, comia pão com mortadela com pingado em qualquer padaria às 6 da manhã, depois do expediente. O Velho Lobo, ele mesmo, não tinha terminado sequer o segundo grau e posso tranquilamente dizer que foi um dos maiores jornalistas que já tivemos e o meu romancista contemporâneo preferido. Quem tiver dúvidas, que leia “À mão esquerda”. É, o jornalismo pode ser uma profissão muito bonita.
Com o tempo, e a exigência de diploma superior, passou a ser feito pelos saídos dos cursos universitários tradicionais que escolheram não exercer as respectivas profissões. Mudou de tom, porque mudaram as classes de origem. Virou, ao fim de um processo complexo de transformações sociais que levaram um engomadinho conservador de extrema direita a assumir a Presidência em 1990, nesse jornalismozinho empolado, classe média-alta, criado nos Jardins e pupilos da Fundação Casper Líbero, bem à moda William Bonner e Veja.

Mas não é sobre o Velho Lobo (que morreu antes que eu pudesse pagar-lhe uma garrafa de bom uísque em troca de algumas horas de conversa) que quero falar, e absolutamente sobre o Bonner, senão sobre a farsa da bolinha de papel.

Nossos amigos da editora Abril, de fato e em definitivo, são como o vinho...aberto! Avinagram diariamente. Não mantiveram sequer um mínimo de sutileza, aquela do jogo bem humorado de palavras, do uso inteligente de imagens, da moderação que a direita no Brasil soube usar algumas vezes, mesmo que poucas. Abraçaram a extrema-direita com todas as forças, e ao menos já não fazem questão de esconder. Ao contrário, esfregam o conservadorismo mais nojento e escabroso nas caras de todos nós semanalmente. Algumas capas são ainda mais emblemáticas que as outras:


Não interessa serem judeus os donos da editora. Serra é o seu Messias! Falso, mas Messias! É uma esperança de voltar à Canaã da mamata. Por outro lado, não mente a Veja quando descreve como “avançadas técnicas de guerrilha petistas” uma bolinha de papel. O PT hoje não ofecere à direita muito mais que esta ameaça.

Sim, meu povo, foi de fato uma bolinha de papel o que levou o nosso Drácula presidenciável a fazer tomografia computadorizada e deixar esperando uma enorme comitiva de militantes tucanos. Foi uma bolinha de papel que fez com que a Veja adicionasse à capa e à edição uma reportagem sobre a importância de tomografias computadorizadas no exame de danos causados por forte pancadas na cabeça. É este mesmo o jornalismo feito no Brasil: na medida que merece o debate político eleitoral, ou seja: chão, baixo, chulo, sem vergonha nem caráter.


Mas (e, neste aspecto, viva os sebos!) não podemos esquecer que o candidato já levou na careca uma pancada um pouco mais grave, e a revista Bundas, “A revista que é a cara do Brasil” e que, a propósito, tinha no editorial sujeitos como o Velho Lobo, o Jaguar e o Ziraldo, mandou ver na capa. Recorde-se: dez anos atrás o nosso Zé Funério levou um ovo na testa de um manifestante, ainda em 2000, quando era ministro de Vossa Majestade Dom Fernando Henrique, o Vaidoso, I e Único. Segue a capa:


O irônico é que na ocasião a Veja publicou: “Foi apenas um ovo, e isso aconselha não exagerar a importância do episódio.” É, pode ser que a ocasião não faça o ladrão; só faça o ladrão roubar.

Sei que não é homogênea a opinião a respeito, mas a minha é que o que falta a Serra é levar na cabeça um pouco mais que bolinhas de papel. Pelo jeito, nos tais porões da ditadura, Serra não demorou a abrir a boca.

O fato, afinal, é que para todas as profissões, ocupações ou situações, das nossas gerações e das que vierem, devemos colocar na lista de atividades: dar à direita brasileira motivos reais pra reclamar.

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