O homem pequeno é necessitado, não tem pão, não tem com que sustentar os filhos, dorme na palha áspera, mas tem o coração leve e alegre; é pecador e malcriado, mas mantém na mesma o coração alegre. E o homem grande farta-se de comer e beber, senta-se num montão de ouro, mas tem sempre a mágoa no coração. Há quem domine as ciências mas não se livre do tédio. Penso eu, então, que quanto maior a inteligência, maior é o tédio. Além disso, vede: andam a ensinar a gente desde o princípio dos tempos, mas o que lhes ensinaram para que o mundo fosse a mais bela e alegre habitação, recheada de todas as felicidades? E digo também: não têm decoro, nem sequer o desejam; pereceram todos, e todos louvam o seu perecimento, sem pensarem em virar-se para a única verdade (ora, viver sem Deus é um castigo, mais nada). Resultado: amaldiçoamos o que nos ilumina e não o sabemos. Que sentido tem viver assim?
O homem que não venera não vive, um homem assim não suportará a si mesmo, nenhum homem. Se rejeitar Deus, venerará o ídolo... de madeira, de ouro, de pensamento. Estes são idólatras, não são descrentes: é assim que devem ser chamados. Mas, então, não existem descrentes? Sim, há quem seja na verdade descrente, e são esses os mais assustadores, porque trazem sempre o nome de Deus na boca. Ouvi falar dessa gente por mais de uma vez, mas nunca a encontrei. Existe, meu amigo, e acho que deve existir.
FIÓDOR MIKHAILOVITCH DOSTOIÉVSKI, em O adolescente
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