“Enchendo a infinda linguiça da vida”
(Guimarães Rosa),
o Movimento Cheguiedali tem a honra de apresentar:
VIDA BREVE
Vitor C Stolfi
2ª edição revista
Florianopolis, 2010
Editora Cheguiedali
Chovia garoa fina. e eu sabia, decor e salteado, que não parava tão cedo. chovia e eu ia indo indo indo. indo ao encontro do sei-lá-o-quê-inesperado. e por isso mesmo inesperado. robada não tem destino, afinal... sem guarda-chuva sem capa nem nada. uma garrafa daquela amarelinha de alambique destilada no esmero escolhida pelo cheiro me fazendo companhia, que me abraçava apertada ao peito, pra me aquecer. no bolso da calça um cigarro enrolado às pressas enfiado no maço do malboro, já amassado, com os filtros umidecidos. podia ter ido de "latão", mas o transporte urbano daqui exige um saco bastante disposto a esperar pa-ci-en-te-men-te num ponto qualquer por algum ônibus. e o frio! melhor ir andando mesmo. assim, com a economia
da passagem, mais as moedas que haviam
no bolso, garanti o malborão. além do mais, eu não tinha pressa alguma de chegar a Lugáhnenhum. se a chuva engrossava eu procurava um abrigo onde desse pra me abrigar. esperava esperava esperava e pensava se a vida só reservava a espera. - tirana não é essa D. Esperança? TiranoUmaCaMinhaCara!!... depois seguia caminho, caminhando. o frio cortante deixava avermelhado o nariz, das narinas começava a escorrer o anuncio de um novo resfriado. as mãos enfiadas nos bolsos naumSeisSeduiam. saquei a indintacta semiserrada rolha da garrafa e bebi uns goles. nos goles bebericados fiquei tonto. e tonto foi que avistei quem sentia saudademoção. e eu não queria que ela me visse. não queria que ela pensasse que eu andava bebendo e eu estava, todos os dias afogando vontades, com pretexto ou não. que eu estivesse sem dinheiro, eu não tinha. que eu não estivesse me alimentando direito e o ronco do meu estomago me acusava. que eu não houvesse tomado banho nos ùltimos dias e que não tivesse onde morar e o meu cheiro acho que me delatava. eu ía precisar ter cuidado ao sorrir pra que ela nâo percebesse meu dente quebrado, e que ela achasse que eu andasse desleixado, que não ía ao dentista, que eu não ia. doeu uma vergonha sentida apenas na dor dos fracassados. pudesse me escondia dentro do meu proprio bolso. ou, numa caixinha de fósforos. pequenez tamanha que senti. esconder-me para que ela não soubesse
que eu era eu. talvez que nem mesmo eu saiba ou fique um dia sabendo. sei que a
chuva caia. poças de água-e-lama-e-óleo-e-sei-lá-que-mais formaram-se ao longo da via. passou um latão e me jogou aquele líquido imundo quando os pneus entraram numa daquelas poças. me molhou interio. dos pés à cabeça. as minhas roupas ficaram totalmente enxarcadas. eu quiz xingar o motorista, mas o susto e o choque fizeram com que eu perdesse o ar, como quando a gente entra debaixo de um chuveiro de água gelada... quando voltei a mim, ela tinha desaparecido. entrara em alguma daquela portas que se confundem com vitrine, não pude perceber qual delas. aliviou-me o desencontro, e eu segui andando indoendo inda mais fundo...
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